03/01/2015 - Jaques Wagner assume Defesa e diz que não tem ‘lanterna na mão para o passado’

Ministro diz que recomendações da Comissão da Verdade serão processadas internamente no Ministério da Defesa
FONTE: OGLOBO, por
BRASÍLIA - O novo ministro da Defesa, Jaques Wagner, afirmou nesta sexta-feira que assume o cargo sem "uma lanterna na mão para o passado". Ele destacou que o seu trabalho será focado no presente, destacando a necessidade de valorizar as Forças Armadas brasileiras. Em relação às recomendações da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que pede o reconhecimento explícito das Forças Armadas sobre suas responsabilidades por violações de direitos humanos durante a ditadura militar (1964-1985), Wagner foi mais evasivo. Ele disse apenas que as recomendações serão processadas internamente no ministério.
— Eu não vim aqui com nenhuma lanterna na mão para o passado. Eu vim aqui olhando para a frente, tem o submarino (nuclear), tem os caças, tem os satélites: 99,9% da minha função é fazer com que se valorizem as forças armadas - disse Wagner, em entrevista após a cerimônia de transmissão do cargo.
Questionado se as Forças Armadas devem pedir desculpas e reconhecer sua responsabilidade sobre o que aconteceu na ditadura, ele respondeu:


—As recomendações que foram feitas pela Comissão da Verdade serão processadas internamente pelo Ministério da Defesa. Eu disse que vou me empenhar. Ultrapassamos aquele momento. Estamos a 50 anos do fato e não há porque a gente ficar colocando nenhum tipo de obstáculo ao que a gente tem pela frente para o Brasil. Então elas serão processadas. Eu digo que a verdade e a transparência não machucam ninguém.
Sobre uma eventual revisão da Lei da Anistia, de 1979, e que não permite a punição de quem cometeu violações de direitos humanos na ditadura, Wagner disse:
— Estou chegando agora e vou estudar essa questão. Evidentemente essa será uma decisão de governo e não uma decisão do Ministério da Defesa.
Wagner disse acreditar nas convicções democráticas dos militares:
— Não acredito que hoje, na cabeça de nenhum militar, esteja presente que a ruptura da democracia possa mudar o desenvolvimento do nosso país. Os militares têm por missão a defesa do país. E, ao defender o país, defendem a democracia.
Cotado para ministérios mais importantes, Wagner acabou se tornando ministro da Defesa. Mas, segundo o próprio, isso foi uma opção dele.
— Pela vitória nossa na eleição do sucessor (Rui Costa, que o sucedeu no governo da Bahia), meu nome viajou por todos os ministérios: Fazenda, Indústria e Comércio, Planejamento, Casa Civil. E no meu primeiro diálogo com a presidenta da República, eu disse a ela que tinha muito apreço em ser designado para o Ministério da Defesa. Então muita gente se surpreendeu: "mas, com esse patrimônio político!" Eu digo: acho que patrimônio político deve ser emprestado ao Brasil. O patrimônio político emprestado ao comando do Ministério da Defesa com certeza é para cada vez mais cicatrizar as feridas que ainda permanecem e tem que ser cicatrizadas, e fazer aquilo que é de natureza, que é o absoluto encontro da Defesa com as nossas Forças Armadas, cada vez mais próximas e integradas - disse Wagner no discurso que fez durante o evento.
Mais tarde, em entrevista questionado que feridas seriam essas, ele respondeu:
— Tem ainda pessoas que perderam familiares, não encontraram familiares e querem ter o direito de encontrar.
Ele afirmou que vai lutar permanentemente em favor de marinheiros, soldados e aviadores. Destacou também que vai trabalhar para tornar as Forças Armadas cada vez mais capacitadas e modernas, ressaltando projetos nas áreas nuclear, cibernética e espacial. Afirmou ainda que vai buscar uma cooperação maior com países de nível de desenvolvimento parecido, como os Brics, grupo que, além do Brasil, inclui Rússia, Índia, China e África do Sul. Comprometeu-se com a recomposição plena da base brasileira na Antártida, destruída por um incêndio em 2012. Disse também que vai usar o patrimônio político para garantir a continuidade dos projetos das Forças Armadas.
— Teremos um ano de aperto. Quero dizer aos comandantes e aos civis do Ministério que esse ministro está à frente na luta pela garantia da continuidade de todos os projetos, que não foram definidos por mim, mas por quem carrega legitimidade: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente Dilma Rousseff — disse Wagner.
Em seu discurso de despedida do cargo, o ex-ministro Celso Amorim, que também já foi ministro das Relações Exteriores, afirmou que estava provavelmente deixando a vida pública. O ex-ministro disse que o diálogo entre as Forças Armadas e a Comissão da Verdade foi o trabalho mais difícil que teve como ministro da Defesa.
— A mais difícil tarefa que tive nessa travessia foi a intermediação entre o agrupamento militar, do qual, repito, muito nos orgulhamos e a Comissão da Verdade. Creio que executamos os melhores dos nossos esforços do que era preciso fazer: dar acesso à verdade, dar acesso às informações, e permitir, dessa maneira o objetivo fundamental da Comissão Verdade, de conhecimento dos fatos. Muitos considerarão insatisfatório, por um lado. Outros considerarão injusto, por outro. Mas o trabalho feito, com a colaboração sempre leal e correta dos comandos militares, intermediada pelos meus dois chefes de gabinete principalmente, foi um trabalho que mereceu, inclusive, um elogio talvez exagerado e injusto do presidente da comissão no dia da entrega do relatório — afirmou Amorim.
O presidente da comissão, Pedro Dallari, de fato elogiou o ministério, mas não deixou de fazer críticas às Forças Armadas no dia 10 de dezembro quando o relatório foi entregue à presidente Dilma. Ele colocou em dúvida a veracidade de várias informações repassadas pelos militares à Comissão da Verdade.
Amorim fez vários elogios aos militares, destacando qualidades como a lealdade e as missões de paz das quais o Brasil participa no exterior (Haiti, Líbano e República Democrática do Congo). Também destacou como sinal de avanço a edição, pela Escola Superior de Guerra, de um livro do ministro Santiago Dantas, que integrou o governo o presidente João Goulart, deposto em 1964 pelos militares.
—Eu quero dizer que isso também é um símbolo de que estamos avançando, os preconceitos desabando e nós estamos consolidando nossa visão democrática — afirmou Amorim.
Os comandantes das três forças - Júlio Soares de Moura Neto (Marinha), Enzo Peri (Exército), e Juniti Saito (Aeronáutica) - estavam presentes, assim como o general José Carlos De Nardi, chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas. Vários ministros prestigiaram a cerimônia: Arthur Chioro (Saúde), José Elito (Gabinete de Segurança Institucional), Armando Monteiro (Desenvolvimento), Ideli Salvatti (Direitos Humanos) e Miguel Rosseto (Secretaria Geral da Presidência da República). Ex-ministros também compareceram, como Alexandre Padilha (Saúde), Miriam Belchior (Planejamento) e Afonso Florence (Desenvolvimento Agrário). Outras presente foi a presidente do Superior Tribunal Militar, Maria Elizabeth Teixeira Rocha

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